quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Tempo e Poesia



A maior abstracção da realidade é o ritmo, subjectivação da duração. Com o ritmo, a palavra demarca-se das referências inertes do tempo linear e converge para o âmbito das dotações subjectivas, a partir das quais o tempo se destaca sobre uma consciência que o cerca e dele se apropria. Daí que nenhuma das formas artísticas mediadas pelo ritmo, a música e a poesia, possa dar a medida do real.

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Nessa medida, a poesia é, verdadeiramente e em sentido bíblico, criação. Acrescenta realidade à realidade. E o seu consolo vem-nos da posse desse real excedente que criámos e que oferecemos. Os deuses não desdenham os sacrifícios, mas são as preces o que mais lhes alegra o coração. Ninguém se compraz quando se lhe devolve o presente que ofereceu. Deus dá o cordeiro, mas quem reza é que lhe sopra pelo ouvido dentro o vendaval que o enlouquece.

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