segunda-feira, 26 de maio de 2025

Alegria

 

A alegria exalta e inebria. Como toda a embriaguez, aliena. Inaugura um movimento centrípeto que nos enclausura dentro de nós. Como a arte, intensifica a vida, mas apenas a vida larvar, a que vai de nós a nós mesmos, sem portas, janelas ou alçapões para o que nos transcende ou mesmo para o que nos rodeia. A alegria é egoísta e, nesse sentido, infantil. Esgota-se toda no invólucro em que se dilata, e nunca se projecta. Não se quer perpetuar ou repetir porque não tem vontade, é pura espontaneidade. O seu legado é o tempo que subtraímos à atenção e à vigília. É míope. Falta-lhe lucidez. Aí, contudo, a sua força: não é controlável nem assimilável. Aí o seu potencial revolucionário: não reconhece autoridade. Tão-só, não sendo motivada por nenhuma ideia, não tendo nenhuma esperança, basta-lhe ser. Como as pedras. Como Deus. Muito pouco, quase nada. Como tudo o que é humano.

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