A maior
abstracção da realidade é o ritmo, subjectivação da duração. Com o ritmo, a
palavra demarca-se das referências inertes do tempo linear e converge para o
âmbito das dotações subjectivas, a partir das quais o tempo se destaca sobre
uma consciência que o cerca e dele se apropria. Daí que nenhuma das formas
artísticas mediadas pelo ritmo, a música e a poesia, possa dar a medida do
real.
*
Nessa
medida, a poesia é, verdadeiramente e em sentido bíblico, criação. Acrescenta
realidade à realidade. E o seu consolo vem-nos da posse desse real excedente
que criámos e que oferecemos. Os deuses não desdenham os sacrifícios, mas são
as preces o que mais lhes alegra o coração. Ninguém se compraz quando se lhe
devolve o presente que ofereceu. Deus dá o cordeiro, mas quem reza é que lhe
sopra pelo ouvido dentro o vendaval que o enlouquece.
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