Devo tanto
àqueles que não amo.
O alívio com que reconheço
que eles são mais importantes para outros.
A felicidade de não ser
o lobo para as suas ovelhas.
A paz que sinto ao pé deles,
a liberdade –
isso o amor não mo pode dar
nem tirar.
Não fico à espera deles,
angustiada à janela.
Quase tão paciente
quanto um relógio de sol.
Compreendo
o que o amor não compreende,
e perdoo
o que o amor nunca perdoaria.
De um encontro até à chegada de uma carta
são só alguns dias ou semanas,
não uma eternidade.
As viagens com eles são sempre tranquilas,
concertos são ouvidos,
catedrais visitadas,
paisagens contempladas.
E quando sete colinas e sete rios
nos separam,
essas colinas e esses rios
podem ser encontrados em qualquer mapa.
Fico-lhes reconhecida
por viver a três dimensões,
num espaço sem lirismo e sem teorias
com um horizonte genuíno e inconstante.
Eles próprios não se apercebem
de quanto guardam nas suas mãos vazias.
“Não lhes devo nada”,
seria a resposta do amor
a esta pergunta aberta.
Wistawa Szymborska
- trad. minha a partir da versão em inglês de Stanislaw Baranczak e Clare Cavanagh
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